Lawfare é uma expressão de origem inglesa que significa usar o ordenamento legal e a estrutura do Judiciário para perseguir adversários políticos.
É uma definição simples para definir um processo complexo. Muitas vezes até existe algum fundamento jurídico e de fato para a abertura de investigações e processos, mas para atingir mais rapidamente o objetivo político, etapas do devido processo legal são deixadas de lado, ainda que se mantenha uma aparência de legalidade.
Em um ambiente midiático, o controle da versão aparentemente verdadeira, hoje denominado como controle da “narrativa”, é crucial. Desta forma, o apoio de órgãos de imprensa e de influenciadores, bem como a repetição da propaganda, deve ser realizado a exaustão. Até que o adversário esteja prostrado a campanha legal e midiática continuará.
Porém, o lawfare fere o direito, porque o processo deve contar com uma relação dialética com base na formação de um triângulo: acusação, defesa e o estado juiz. Como dissemos, é uma relação processual que deve contar com a equidistância entre partes e juiz.
Cada parte deve ter controle de que o juiz considerará as versões com fundamento no ônus de prova. Assim, é dialético por envolver tese, antítese e síntese (sentença).
Atendendo ao comando do título do texto, temos que Bolívia e Argentina, após a subida ao poder de partidos de esquerda, parecem estar tentados a perseguir seus desafetos políticos.
Na Bolívia, se Evo foi apeado do poder por um golpe de estado, é necessário considerar que a célere, espetacular e midiática prisão da ex-presidente Jeanine Áñez, escondida dentro de uma cama box, acusada de conspiração, sedição e terrorismo, já foi denominada por Áñez como perseguição política.
Na Argentina, a pedido do Presidente Férnandez, foi denunciado o ex-presidente Mauricio Macri e quatro funcionários por “fraude” em acordo com o FMI.
Basicamente, Macri e equipe são acusados de utilizar as verbas do acordo para fins distintos do que o autorizado por Lei. Já desde 2020 Macri vem sendo investigado por escutas e espionagem de adversários.
Nem se deixe de mencionar o aparelhamento do Judiciário promovido por Férnandez/Cristina que deu origem aos “banderazos” de 2020, que ajudou a sabotar o programa de combate à pandemia que corria firme na Argentina.
Seria diferente no Brasil se a esquerda viesse a ganhar em 2022 o pleito eleitoral, ou as medidas tomadas seriam feitas longe de holofotes e dentro do devido processo legal?
Também não se perca de vista que o aparelhamento do Judiciário e uso da máquina do Estado não é ato exclusivo da esquerda. Lamentavelmente é um processo do governo de plantão em cada país.
O que a América do Sul necessita seria afastar esse jogo de caça e rato que habitualmente termina em golpes de estado, operações fracassadas por nulidades processuais, com perda de empregos e de milhões de dólares surrupiados, assim como dinheiro gasto com o alto custo das máquinas administrativas envolvidas nas ações.
Um caminho do meio no governo, a autorregulamentação necessária da imprensa, a reforma das indicações ao Judiciário, talvez seja um bom começo.
Cássio Faeddo. Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP.