O desafio da social democracia brasileira para 2022

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De acordo com recentes notícias, Joe Biden pretende afastar os EUA do neoliberalismo. Este sistema econômico com forte impacto social foi iniciado nos final dos anos 70, com a ascensão ao poder de Ronald Reagan e Margareth Thatcher. E Biden está certo. É o que tem que ser feito.

Explica-se: a China foi o país que melhor aproveitou as oportunidades criadas pelo neoliberalismo globalizado, ainda que inicialmente tenha passado por cima de patentes e direitos do autor, dentre outras ações, como sabido.

O fato é que esse mundo desbalanceado colocou os países emergentes como o Brasil em  situação de penúria, especialmente experimentada nas grandes metrópoles, pois estes países centraram-se na produção de commodities agrícolas e de extração mineral como alternativas à centralização de produção industrial na China. E para piorar o quadro, a falta de investimento em tecnologia e ciências afetou diretamente países como o Brasil, carente de direitos sobre patentes, invenções etc.

Temos que a Covid-19 antecipou a crise deste sistema em alguns anos, e tudo ruiu bruscamente. A marolinha da crise de 2008 que chegou ao governo Dilma, por volta de 2014, virou um tsunami no período bolsonarista.

Olhando para os anos 90 vimos que as ações de sucesso no governo FHC, que indicavam um caminho no primeiro mandato para desenvolvimento pleno, sofreram forte baque com as crises em meados do segundo mandato, geradas pelo mercado dos países emergentes, como Argentina, Coreia e Rússia. E pior, nossas reservas cambias eram baixíssimas.

Porém, à época, ainda havia a busca por um equilíbrio entre a missão do estado e as possibilidades crescentes na iniciativa privada. Entre 1994 até 1998, o Brasil crescia. Mas eram apenas os primeiros passos após a decadência da receita econômica militar e da hiperinflação.

Todavia, o desgaste do fim do governo FHC gerou o nascimento da década do PT. Sem descurar do mérito em muitos pontos, o fato é que o governo de Lula esqueceu dos custos, ética, operariado, que perdia seus empregos para chineses e da governança. O resultado está aí no Brasil de 2021.

Possivelmente, petistas apaixonados dirão que a culpa é de Sergio Moro e da Lava Jato. Não é. Lava Jato é consequência. A causa foi a tomada do estado por uma quadrilha especializada em fraudar contratos da indústria de petróleo. Só houve Sérgio Moro porque houve um governo corrupto até as raízes mais profundas.

De lá para cá, a social democracia no Brasil amarrou-se muito tempo com a doutrina thatcheriana e aprofundou-se em temas e apoios que desnaturam os ideais social democratas.

Dois grandes exemplos residem na reforma trabalhista e o outro na reforma da previdência.

No primeiro caso, reforma trabalhista, houve e há injustiças e inserções de artigos maliciosos na CLT. As inserções são as que brindam maus pagadores em diversas ocasiões. Responsabilidade de sócios, justiça gratuita e prescrição intercorrente são alguns exemplos.

Não nos percamos nesses temas que empobreceram a população, mas o fato é que a social democracia não poderia repetir o coro de que a culpa era do trabalhador e legislação social. Também não passa despercebido que o desmonte do Direito do Trabalhou visou afetar a base sindical anacrônica, mas os reflexos no mundo do trabalho foram perversos.

Por fim, restou o paradoxo do fim do direito do trabalho e dos direitos sociais no Brasil. Como consumir e realizar projetos sem condições financeiras e com trabalho autônomo e precarizado? A social democracia deveria responder, pois aquiesceu com Rodrigo Maia, Paulo Guedes e outros na aprovação de projetos de miserabilidade social.

Escassez e população pobre e ignorante conduziram ao messianismo; aqui no país, nas figuras de Jair Bolsonaro e Lula. Pior, com Bolsonaro a extrema direita  sobe e um brinde ao sistema miliciano nascido no Rio de Janeiro.

Se continuarmos neste caminho do personalismo político, nos próximos anos, veremos um recrudescimento do populismo e do radicalismo de cunho religioso, de violência exacerbada e até mesmo de perseguição étnica e de gênero.

Muito possivelmente, aqui no Brasil, acompanharemos a ruptura do falso cordialismo brasileiro de forma mais contundente. Como exemplo, um país católico que se transforma dia a dia em um país fundamentalista-materialista- neoevangélico, com forte sectarismo e de perseguição as demais religiões, especialmente de matriz africana.

É fato que Bolsonaro, como Trump, já plantou no Brasil as sementes da discórdia e da mentira, e não sairá da cadeira presidencial de forma tranquila. E uma vitória de Lula provavelmente será acompanhada de apadrinhamentos e retaliações. E tudo indica, com o consumo e endividamento como política de governo novamente.

Para quem não pactua com essa versão dual e terrível, o desafio será a implantação de sistemas de emancipação da classe trabalhadora sem torná-la refém de um populista novamente.

Hoje temos trabalhadores sem esperança e dependentes de personalidades salvadoras da pátria. Quanto mais precarizados mais dependentes são.

Não é possível mimetizar a Argentina no que se refere ao Peronismo x Neoliberalismo. O Brasil poderia muito mais.

A social democracia poderia retomar seu caminho histórico concentrando esforços no alongamento de dívidas de pequenos negócios, otimizando o recebimento de tributos para financiamento do estado, reduzindo a máquina administrativa no que se refere às atividade-meio (em especial, cargos comissionados), atribuindo responsabilidades a gestores competentes (competência formal educacional), ampliando distribuição de renda, reindustrializando o país com visão de longo prazo, investindo maciçamente na área de serviços especializados (pela capacidade de geração de empregos de forma mais célere), reposicionando o país no âmbito das relações exteriores, investindo fortemente em infraestrutura, dentre outras possibilidades.

No decorrer desse processo seria possível experimentar uma mudança política no sistema parlamentar de castas, e também pondo fim ao presidencialismo de coalizão. Se é para haver coalizão, que seja via parlamentarismo. Mas não qualquer parlamento, um parlamento com excelência na formação e comprometido com seu eleitorado.

Quanto ao presidencialismo,  é impraticável que um chefe de estado/governo no Século XXI não domine o inglês, não tenha experiência em administração pública anterior, e seja exercido por um aventureiro de plantão. Em utópica teoria, o nível educacional e de experiência de gestores e políticos deveria ser mais rigoroso em termos constitucionais.

Porém, será muito difícil sobreviver à polarização de Lula x Bolsonaro. Continuaremos reféns da mesma lógica de 2018. Historicamente, desde a eleição de Tancredo Neves o PT corre em raia isolada e só faz coligações quando protagonista. Não vai mudar. Carta fora do baralho.

Uma terceira via social democrata deveria ocupar o lugar de Bolsonaro desde já no papel de uma opção de centro racional. Bolsonaro deveria ser isolado à sua franja radical e votos de centro esquerda também podem ajudar.

Há diversos nomes para compor uma chapa vencedora, mas o trabalho de reconstrução requererá habilidades de ser coletivo. Ilustrando, a experiência na paradiplomacia com a China realizada por João Dória que muito amadureceu desde a primeira eleição; Eduardo Leite, com sua ótima formação de base; Ciro Gomes, com toda bagagem pessoal e vivência política; Kalil, com mão forte na gestão de Belo Horizonte, tudo conduz para uma gestão coletiva. Mas o tempo corre em desfavor da terceira via.

Concluindo, para a reconstrução do Brasil serão necessárias várias pessoas e projetos compartilhados, no lugar do personalismo de um messias. Porém, esta missão requererá abnegação e renúncia a projetos pessoais.

Cássio Faeddo. Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP

 

 

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SOBRE MIM

Cassio Faeddo

Cassio Faeddo

Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais FGV SP

Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho.

Especialista em Direito Público internacional e Relações internacionais.

Professor universitário desde 1998 tendo lecionado nas Faculdades Hebraico Brasileira Renascença, Anhembi-Morumbi, Unibero e Centro Universitário SENAC.

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